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segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Representações Sobre Diversidade Cultural No Campo Educacional

                Atualmente vivemos um momento efervescente de discussões, nos mais diversos espaços sobre questões que dizem respeito às representações sócio-culturais ampliando novas concepções entorno de inúmeros aspectos presente nas linhas e entrelinhas da sociedade, como a construção de identidades, as manifestações culturais, as formas de viver e relacionar-se com o diferente, com o outro. Discussões estas essenciais para entendermos a variedade das relações que se processam a partir do contato entre grupos que compõem essa densa diversidade.
            Na perspectiva de Neusa Maria de Gusmão em Antropologia e Educação: Origem de um Diálogo percebemos as dificuldades existentes em se colocar no lugar do outro[1], de identificar no outro e suas representações as bases para a sustentação do meio em que estou inserido, portanto o desafio estar em como se trabalhar com o múltiplo contribuindo para o reconhecimento e valorização da produção realizada na teia da diversidade  cultural. Desafio este baseado nas seguintes questões: Como relacionar diferentes representações culturais? Qual O poder da educação nesse processo? E da escola como espaço social onde essas relações acontecem? E por que apesar desses debates ainda há resistência em se trabalhar com a diversidade cultural, especialmente no campo da educação?
            Segundo Silva (2000) a representação cultural estabelece identidades individuais e coletivas o que nos leva a considerar que a diversidade cultural                                                     apresenta um importante papel no tocante à construção de significados que atravessam todas as relações mantidas na sociedade. Quando evidenciamos a expressão “diversidade étnico-cultural” estamos nos transportando para um campo em que diferentes grupos se entrelaçam em diversos setores sociais procurando manter costumes, valores e concepções, as bases de suas identidades. É nesse contexto que os discursos se processam e que a resistência por meio de movimentos sociais de reivindicações aponta que há muito ainda o que se percorrer, na busca de um ambiente de abordagem onde os “sujeitos sócio-culturais’ possam ter o direito que passa pelo reconhecimento da importância da diversidade. É preciso por em prática o que estar na lei, muitos comemoram a promulgação da lei n° 11645 conferindo a inclusão de conteúdos que abordem a História da África e dos Africanos na Educação Básica assim como da cultura afro-brasileira e indígena[2] para valorizar as suas contribuições na construção do que é o Brasil reforçando a função da escola de ambiente onde a dimensão cultural terá visibilidade e posicionando os sujeitos para a superação de preconceitos, como a discriminação racial ou de gênero. No entanto o ensino direcionado pela lei em destaque não terá o respaldo se é visível a resistência tanto na produção acadêmica como nas próprias escolas em discutir, compreender e oferecer o espaço necessário para que essa diversidade apresente sua significação. Mas qual o significado de cultura? Será que esses profissionais possuem esse conhecimento?
            A cultura antes posta como imutável, apenas como um objeto de transmissão entre gerações configura-se nessas discussões com uma dinâmica marcada e influenciada pelas transformações sociais e notadamente pela produção de novas formas de posicionamento, isto é cada cultura oferece os sujeitos pela classificação mecanismos para dar sentidos e significados ao mundo. Assim percebemos a cultura como “sistemas partilhados de significação” produzidos por grupos e classificados por outros. É como a antropóloga Mary Douglas argumenta:

A cultura serve de intermediação para a experiência dos indivíduos. Ela fornece algumas categorias básicas pelo qual a idéia e os valores são higiênicamentes ordenados. ( Douglas, 1966, p. 38).

            Aqui Douglas desenvolve a idéia de que a cultura tem papel central na produção de significados nas relações sociais o que podemos identificar nos variados aspectos do cotidiano. Por exemplo, uma dança tradicional praticada atualmente por um grupo afrodescendentes produz significados reforçando as relações com o grupo em particular, ordenando valores, mas que ao entrar em contato com os demais grupos que não partilham dessa pratica cultural recebe varias classificações. A dança estabelece uma identidade para os que a praticam (sua cultura), recebendo influências das transformações sociais, no entanto sem que o grupo perca a identidade original.
            A cultura atua como um código que permite a cada individuo do grupo o respeito e o reconhecimento entre eles, porém o contato com o outro traz a incerteza a não valorização. Essas discussões trouxeram à tona que é essencial diversificar as formas de conviver com o múltiplo. Nesses debates tomamos como elemento de análise o Movimento Negro e sua luta na sociedade brasileira no desenvolvimento de trabalhos na busca de práticas pedagógicas que atentem para o afastamento de práticas discriminatórias existentes até nos currículos da educação. E como exemplo de prática cultural os resultados do estudo no espaço escolar de uma manifestação cultural de origem afro praticada na cidade piauiense de Regeneração apoiado na pesquisa intitulada No Compasso da Cultura Popular: Entre Passos, Versos e Representações-Pagode Zabé Fulô[3] que se encontra em construção encaminhada pela professora e historiadora Gleicy Kelly de Souza Brandão para verificarmos os discursos e como os diferentes sujeitos presente na escola reagem ao contato com a diversidade.
            Quando discutimos diversidade étnico-cultural entendemos etnia como o “termo usado para fazer referencia às características culturais, seja a língua, costumes, religião ou sentimento de pertencimento”, partilhados por um povo, sendo nesse contexto que observamos o Movimento Negro em sua luta, objetivando apresentar que como qualquer outro povo construiu sua identidade étnica possuindo um papel importante na construção histórica e cultural do Brasil, que suas particularidades merecem igual atenção nos currículos e na produção acadêmica, extinguindo a visão destes apenas como um elemento agregador, mas também transformador das estruturas do Brasil.
            Partindo da idéia de que identidade e cultura não são fixas[4] se transformam a partir das relações a identidade do negro no Brasil surge da representação de si e do contato com o outro e de todo o “circuito cultural” em que estão inseridos. Entretanto essa mesma identidade presente nos locais onde essa cultura circula sofrem intensas influências em integrantes que estão em maior contato com outras etnias e pelo próprio contexto histórico do país em impor elementos das culturas dominantes sobre as minorias. A escola vaia atuar como local aonde essas identidades entram em conflito e se constroem, pois na escola os sujeitos formam pensamentos, entram em confronto com inúmeras opiniões. Mas como transformar a escola nesse lugar de valorização, compreensão e respeito para com as diferenças? Há trajetórias que se configuram como o meio para um trabalho satisfatório em torno dessas questões                                            que visam contornar o problema da discriminação quanto à diversidade cultural. O primeiro passo é trabalhar na formação dos profissionais da educação e diminuir a escassez de informações sobre as temáticas nos currículos. O material didático que chega às escolas necessita de uma reavaliação para evitar conteúdos com imagens negativas a cerca do negro e outros aspectos culturais. É de fundamental importância a construção de um material que conduza aos papéis desempenhados pelo negro além do mesmo como escravo e sua participação na sustentação econômica da nação, mas que sua cultura adquira novo foco e possa ser analisada construtivamente com grande significação na formação da identidade nacional, uma identidade plural.
            A formação acadêmica bem como a pesquisa deve estabelecer outros contornos na produção desse material e que ultrapassem os muros da academia e se entrelaçar nos campos sociais onde essa diversidade está sendo produzida e representada, incluindo a escola. Aqui há o encontro e o desencontro dessa diversidade, nesta os conflitos se processam, imagens são criadas e é sem duvida o espaço onde todas essas discussões teóricas são travadas na prática. Numa abordagem prática do que está na lei quanto ao estudo da cultura afro-brasileira citamos a pesquisa desenvolvida por Brandão (2011) procurando perceber como o estudo de uma dança da cultura afro presente há anos na cultura popular da cidade seria interpretada pelos alunos em discussões em sala de aula. O intuito do trabalho era apresentar que a diferença não deve ser vista como no sentido de inferior e que na diversidade não existe superioridade nem inferioridade entre culturas, mas singularidades que nos tornam integrantes de uma mesma realidade (Brandão, 2011).
            Na analise da professora podemos confirmar os entraves que ainda existem em trabalhar com essas temáticas pelos obstáculos mencionados:
Os desafios começam pela própria formação acadêmica que precisa estar sendo sempre ampliada complementando-a com um material adequado e pelo interesse do próprio professor em transformar essa realidade cultural num importante mecanismo entre aluno e toda a comunidade escolar. O contato dos alunos com o pagode provocou um novo olhar, embora classificando este como diferente, abriu-se um espaço para o respeito e valorização, ou seja, todas as mudanças irão partir pela busca e acesso conhecimento, extinguindo essa “escravidão cultural” em que não só os negros, mas como as “minorias” com informações restritas nos currículos estão submetidos (Brandão, 2011).

            O pagode em questão é tradicional, recebeu influências externas, mas não perdeu a essência que propicia o sentimento de pertencimento dos sujeitos ao grupo que o pratica, sendo essa a busca de todo ser humano, encontrar em práticas culturais, um laço que ofereça segurança em meio a essa pluralidade cultural. O contato dos alunos com um costume preservado, mas que tem sua essência desconhecida por muitos é um simples exemplo da complexidade advinda das diferentes identidades criada pelos indivíduos no interior das relações sociais e nesse “circuito cultural”. O trabalho incluiu uma reivindicação do Movimento Negro, que em grande parte das instituições é ignorado, pela falta de uma melhor formação dos profissionais de educação, um contato maior dos mesmos com essa diversidade, até mesmo bom senso e interesse em refletir, discutir e compreender sobre cultura de um modo mais abrangente e vital para a construção do que somos frutos dessa multiplicidade.
Portanto de maneira geral é preciso perceber que educar significa introduzir a cunha da diferença em um mundo que sem ela se limitaria a reproduzir o mesmo e o idêntico, um mundo parado, morto (Silva, 2000), ou seja, tratar o “outro como o outro”, valorizando suas particularidades, perceber a diversidade como complexo campo produtor de identidade que se fundem e dão sentido a todas as suas representações.         
        TEXTO: Gleicy Kelly de Souza Brandão  E  Ismael Lima Dantas


[1] GUSMÃO, Neusa Maria de. Antropologia e Educação: Origens de um Diálogo> In: Antropologia e Educação- Interface do Ensino e da Pesquisa. Cadernos Cedes,n° 43, UNICAMPI, 1997.
[2] Orientações Curriculares para o Ensino Médio. V. 3- Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2008.
[3] BRANDÃO, Gleicy Kelly de Souza: Projeto escolar sobre diversidade cultural em Regeneração no Piauí - Pagode Zabé Fulô, 2011.
[4] SILVA, Tomaz Tadeu da: Identidade e diferença: A perspectiva dos estudos culturais/Tomaz Tadeu da Silva (org). Stuart Hall, Kathryn Woodword-Petrópolis,RJ. Vozes, 2000

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